11.2.10

Cobranças

- Tá bom, eu te empresto o livro, agora me deixa quieto.
- Queria que você me ouvisse mais. Cê tá sempre correndo pra baixo e pra cima e esquece de mim.
- Não, eu não esqueço de você. Eu apenas tenho um jeito diferente de ver a vida, de encarar as coisas. Eu organizo meu tempo diferente de você.
- Organiza e me deixa com as migalhas. Você não tem tempo pra mim, só pra esse teu trabalho estúpido.
Ele colocou o livro sobre a mesa e olhou para ela. Respirou fundo, medindo as palavras, deixando o silêncio preparar a situação para uma frase de efeito como a dos filmes que viam juntos. Para um frase forte, dessas de um diálogo que fosse lembrado em conversas de botequim. Para uma frase que ele sabia que não viria. Deixou o silêncio prepará-la para ouvir uma frase como todas as frases comuns do cotidiano. Uma frase tão pequena quanto a vida miúda deles dois.
- Meu trabalho não é estúpido, ele te comprou esse vestido e esses brincos. E ele paga o aluguel desse apartamento.
Ela deixou-se cair na poltrona em frente a ele. As pernas ainda eram tão bonitas como quando eles se conheceram.
- Eu sei, eu só não quero mais ficar tanto tempo sozinha.
- Eu não estou te deixando sozinha, eu estou aqui...
- Mas parece que não está!
- Poxa, eu trabalhei pra caramba hoje, quero só uns minutinhos pra relaxar... aí depois eu vou ser todo seu, você sabe disso... até quando você não quiser mais.
- Eu não quero ficar sozinha!
- Você não está sozinha - ele levantou-se, jogando o livro sobre a mesa, Foi até ela e a abraçou, beijando-a - eu estou aqui, e você não está sozinha!
- Obrigado... sabe... eu preciso disso... pra ficar sozinha eu não venho pra cá e fico com meu marido.

2 comentários:

Daniel Caetano disse...

Hahahaha... Fenomenal!
Muito bom mesmo, Lion!

marcelo alves disse...

Muito bom. Sempre surpreendendo nas últimas linhas.