6.1.10

Teresa

- Vem cá... chega pra lá e me conta o que andou acontecendo?
Teresa levantou os olhos do jornal e chegou-se um pouco para o lado no banco em frente à casa para dar lugar. A amiga subia a rua, voltando o trabalho e parara para saber das novidades dela. Corria o boato na fábrica que o marido dela, após uma briga, retalhara o vestido vermelho novo dela e que o clima no número 76 da Rua das Acácias não era dos mais familiares.
- Simples, nega. Aquele traste foi no forró do Ademir e não me levou. Chegou em casa três da manhã, fedendo a pinga e a vagabunda. Fiquei quietinha na minha, nem falei nada. Nem reclamei, no dia seguinte, tava lá, de manhã. Café na mesa, pãozim na manteiga, tudo nos conformes. Mastiguei a raiva uma semana. No sábado seguinte, depois do almoço, comprei uma garrafa de Princesinha, tomei um banho, me perfumei e entrei no quarto com ele. Oito da noite ele tava dormindo, dei uma chave de perna do desgraçado que, juntando com a meia garrafa de pinga, deixou ele num desmaio que só vendo. Tomei outro banho, meti aquele vestido vermelho, colado nas ancas, pus o que sobrou da garrafa na bolsa e me mandei pro forró. Fiz que nem ele. Voltei já amanhecendo, bêba que nem uma gambá e nem fiz questão de esconder o chupão que ganhei no quengo.
- Mas e aí? Ele num falou nada não?
- Inté tentou, mas quem disse que eu deixei. Só mandei pra ele, antes que ele abrisse a boca: "Quando cê voltar no forró, quero estar do teu lado, traste, senão vai ser essa trocação de chumbo até o dia do juízo, ou acaba a palhaçada aqui ou essa história vai virar carnaval de uma vez!"
- Ê, ê, mulher, e ele?
- Meteu a viola no saco, minha filha, sentou, tomou o café. Só reclamou de eu ter secado o resto de Princesinha. Aí eu achei que ele tinha metido o galho dentro. Só sei que dei um pulo na minha irmã ali no fim da tarde, ver como ela tava. Mas não é que quando eu voltei, o safado tinha retalhado meu vestido vermelho na navalha?
- Ai meu Deus! Então era verdade!
- Ô se num era, mas nega, o sangue subiu nas ventas, abri o armário, tirei as roupas dele tudo de lá de dentro, não esqueci nem a camisa do Botafogo, piquei tudo que parecia enchimento de almofada e meti numa mala, quando ele chegou do futebol, me achou de cabo de vassoura numa mão e a mala na outra. Joguei a mala na frente do traste e lembrei a ele que a dona do barraco aqui ainda sou eu, que ele veio de visita e resolveu que debaixo de meu teto e no meio das minhas pernas é que era bom de morar e foi ficando. Pus ele de cachorro pra baixo e disse que era pra ele tomar tenênça na vida e que eu que mandava, agora da porta pra dentro e da porta pra fora.
- Ai, ai, ai, Teresa, mas e ele? Ficou quieto?
- Minha filha, e aquilo é homem de ficar quieto? Partiu pra cima de mim! Tive de pranchar o cabo de vassoura na cabeça dele com tanta força que até quebrou! Só sei que o bicho caiu no chão gemendo e resmungando...
- Nossa, Teresa, que coisa feia!
- E o pior nem foi isso... o pior é que ele pediu desculpas, emprestou uma muda de roupa no vizinho e continua lá em casa.

Um comentário:

Nazareth Malaphaia disse...

Muito bom!!! Parece história da vida privada. Eu fiquei imaginando a cena sendo gravada.
Adoreiiiiiiiiii