4.1.10

Ressaca

Abriu os olhos. O gosto amargo na boca chegou primeiro, logo em seguida veio a dor de cabeça. Deixou-se cair novamente na cama, o mais suavemente que pôde. Torou a fechar os olhos, tentando lembrar-se da noite anterior. O sol que invadia o quarto, sem dar confiança para as cortinas puída, dizia-lhe que já era tarde, bem tarde. Ainda bem que não trabalharia aquele dia, nem nos próximos. Respitou fundo e fez nova tentativa de se levantar da cama. Segurou as pontas quando a tontura o atacou. Apoiou-se na parede e arrastou-se até o banheiro.

A figura que o encarava no espelho não era das mais apresentáveis. As olheiras fundas, de um tom esverdeado, deixavam clara a vida de devassidão que ele vinha levando nos últimos tempos. Lavou o rosto e escovou os dentes duas vezes, tentando minimizar o gosto ruim. Cogitou a hipótese de tomar um banho, desistiu quando lembrou que o chuveiro estava queimado. Ainda só de cuecas foi cambaleando até a cozinha.

A casa era o cenário de uma terra devastada. Cinzeiros cheios, latas de cerveja e garrafas de todos os tipos estava espalhadas pelos cômodos. Em cima de mesas, embaixo das cadeiras. Sobre o sofá, uma moça cujo nome ele não lembrava roncava, abraçada a uma garrafa vazia de vodca. Quase escorregou numa calcinha rosa no corredor que levava à cozinha. Olhou para trás, confirmando a procedência e chutou-a para um canto.

Abriu a geladeira. Para sua surpresa, ainda restavam algumas latas de cerveja. Pegou uma e descobriu um celular atrás das latas. Era o seu, e funcionava, apesar de estar gelado. A cerveja gelada melhorou um pouco o gosto ruim da boca. Resolveu conferir se havia algum recado no telefone, ainda sem entender como o mesmo tinha ido parar dentro do refrigerador. Não havia mensagem alguma, melhor assim. Procurou o telefone da faxineira, ela atendeu na segunda tentativa e disse que iria na parte da tarde. Eram onze da manhã, daí a pouco ela estaria arrumando a bagunça que imperava ali há alguns dias.

Resolveu voltar ao quarto. A menina ainda dormia abraçada à garrafa, mas não roncava mais. O laptop continuava ligado e funcionando sobre a escrivaninha.Por sorte, não havia entornado bebida nele. Conferiu novamente a conta bancária. O valor recebido com a venda do imóvel que recebera de herança ainda estava quase todo lá, apesar dos esforços em dilapidá-lo nos últimos dias. A cabeça latejando não impediu que ele fizesse novamente as contas. O dinheiro permitiria que ele ficasse pelo menos um ano e meio sem trabalhar. Deu uma risada que terminou em arroto e resolveu acordar a menina da sala. Tinha de perguntar-lhe o nome e aproveitar as duas horas que ainda tinha até a chegada da faxineira.

Nenhum comentário: